domingo, 2 de outubro de 2011

A Crise do Ter e do Ser

Culto Comunidade da Cruz – 01.10.2011
Pr. Michel Medeiros
A Crise entre o Ser e o Ter
Introdução:
O que me chama atenção nessa parábola é que Jesus dá nome a um personagem, que é o mendigo Lázaro. O rico não tem nome. Um era conhecido por Jesus e o outro não, ele tem posses mas não tem identidade. E aí descobrimos uma característica, ou o que Jesus quer comunicar com essa estória: que queremos ser definidos por aquilo que temos e não pelo que Deus quer de nós.
Quem é você? Você é alguém amado por Deus, e isso é suficiente. Nós, contudo, precisamos agregar valor, e vamos construindo nossa identidade a partir do que fazemos e conquistamos.
Então a partir dessa parábola, pecado não é apenas algo moral, mas também a falsa construção de uma identidade a partir de outros valores. A construção de um outro ‘eu’ que não o ‘eu’ encontrado no amor do Pai, um ‘eu’ sem personalidade. A mais genuína personalidade cristã é que apenas somos.
“O que você quer ser na vida?” É como se o pobre não tivesse nenhum valor. E aí entramos nessa crise de que temos que desempenhar muitas coisas. O profissionalismo gera essa crise de que devemos ser empreendedores, competentes. O eficientismo gera essa crise de que deve ser o mais eficiente. A vaidade gera a crise de que você só é alguém se sai do anonimato.  Esta é a crise do ‘ser x ter’, ‘ser x empreender’, ‘ser x fazer’, ‘ser x produzir’...
Contudo esta não é a verdade segundo o evangelho. Então qual é a verdade?
Santo Agostinho dizia que se você quer conhecer uma pessoa não a pergunte o que ela faz, mas o que ela ama.
A grande questão é: o que Deus pensa de você?
Leiamos o texto: Lucas 16:19-31
“Ora, havia um homem rico, e vestia-se de púrpura e de linho finíssimo, e vivia todos os dias regalada e esplendidamente.
Havia também um certo mendigo, chamado Lázaro, que jazia cheio de chagas à porta daquele;
E desejava alimentar-se com as migalhas que caíam da mesa do rico; e os próprios cães vinham lamber-lhe as chagas.
E aconteceu que o mendigo morreu, e foi levado pelos anjos para o seio de Abraão; e morreu também o rico, e foi sepultado.
E no inferno, ergueu os olhos, estando em tormentos, e viu ao longe Abraão, e Lázaro no seu seio.
E, clamando, disse: Pai Abraão, tem misericórdia de mim, e manda a Lázaro, que molhe na água a ponta do seu dedo e me refresque a língua, porque estou atormentado nesta chama.
Disse, porém, Abraão: Filho, lembra-te de que recebeste os teus bens em tua vida, e Lázaro somente males; e agora este é consolado e tu atormentado.
E, além disso, está posto um grande abismo entre nós e vós, de sorte que os que quisessem passar daqui para vós não poderiam, nem tampouco os de lá passar para cá.
E disse ele: Rogo-te, pois, ó pai, que o mandes à casa de meu pai
Pois tenho cinco irmãos; para que lhes dê testemunho, a fim de que não venham também para este lugar de tormento.
Disse-lhe Abraão: Têm Moisés e os profetas; ouçam-nos.
E disse ele: Não, pai Abraão; mas, se algum dentre os mortos fosse ter com eles, arrepender-se-iam.
Porém, Abraão lhe disse: Se não ouvem a Moisés e aos profetas, tampouco acreditarão, ainda que algum dos mortos ressuscite.”

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Meus irmãos, a 1ª interpretação desse texto pode ser muito errada. É de que a pobreza nos levará para o céu, e de que a riqueza nos levará ao inferno. Isso pode desenvolver um apego à miséria e à doença e ao sofrimento. E nós temos uma propensão a esse apego por causa do nosso histórico cultural-religioso católico. E a gente acredita mesmo que o sofrimento vai nos recomendar a Deus, mas não é isso que Jesus quer nos ensinar.
Leiamos o verso 14 do Capítulo 16 para entender o contexto: Jesus contava a parábola aos fariseus sobre um administrador infiel que cuidou mal do dinheiro, e os fariseus zombavam dele. O texto começa no Capítulo 15:1 – aproximavam-se de Jesus todos os publicanos e pecadores, e os fariseus reclamavam que Jesus conversava com essas pessoas. E aí Jesus conta três parábolas para que os fariseus entendessem que estavam errados sobre sua religiosidade e avareza.
O problema dos fariseus é que eles não acreditavam que estavam perdidos, pois criam que as bençãos do Senhor estavam na riqueza caso fossem fiéis à Lei, por isso era complicado inverter seus conceitos. Jesus tinha que convencê-los que a marca da salvação de um homem não estava na prosperidade. Daí o choque da parábola de Lázaro e do homem rico.
O homem rico era um judeu, tanto que chamava Abraão de Pai Abraão. E Aabraão o reconhecia como filho. E esse homem também gostava de ostentar a sua riqueza, como o texto dizia.
E o mendigo, Lázaro, ficava à porta do rico. Foi jogado à porta de sua casa. Os comentaristas dizem que o povo talvez o tenha deixado ali para que rico o ajudasse. Mas o rico nada fez. E ressalte-se que há na lei judaica inúmeras previsões sobre a generosidade. Ex: no milharal só se colhe no meio, as beiradas ficam para os pobres. E, se cai um milho do cesto no chão, não se recolhre, fica para os pobres. Esse rico, portanto, não estava cumprindo a lei judaica.
Esse mendigo, então, vivia em situação de extrema indignidade. Por vezes, olhamos os mendigos e pensamos “esse homem foi abandonado por Deus”, e Jesus diz FALSO. As marcas do amor de Deus por nós não estão na nossa condição de vida. Não usemos os nossos critérios humanos para avaliar o amor de Deus por nós.
E aí esses dois homems morreram. Lázaro foi para o seio de Abraão levado pelos anjos e o rico foi sepultado. Interessante que o texto faz a distinção material do sepultamento. E nesse ponto eu lembro um dito popular: "Reputação é o que as pessoas dirão sobre você no seu funeral. Caráter é o que dirão sobre você no céu".
V. 23 – Jesus descreve o céu e o inferno. A conversa entre o rico e Abraão é fictícia, pois não há a possibilidade de tal diálogo. O rico pede para que Lázaro volte para evangelizar sua família e Abraão diz que já existem Moisés e os profetas.
Definitivamente a salvação não está na riqueza e pobreza. Se fosse assim, seria só nos desfazermos de nossos bens.
Salvação é a morte de Cristo por nós na cruz, o seu amor por nós. O nosso ‘eu’ é um ‘eu’ amado. Não precisamos construir nenhuma outra identidade baseada nos valores desse mundo. Esses valores a Deus nada importam.
Nesse sentido, vejamos 1 Coríntios 13:1-3
“Ainda que eu falasse as línguas dos homens e dos anjos, e não tivesse amor, seria como o metal que soa ou como o sino que tine.
E ainda que tivesse o dom de profecia, e conhecesse todos os mistérios e toda a ciência, e ainda que tivesse toda a fé, de maneira tal que transportasse os montes, e não tivesse amor, nada seria.
E ainda que distribuísse toda a minha fortuna para sustento dos pobres, e ainda que entregasse o meu corpo para ser queimado, e não tivesse amor, nada disso me aproveitaria.”
Portanto nós temos um verdadeiro ‘eu’ e um falso ‘eu’. O verdadeiro é aquele que se encontrou no amor de Deus. O falso é aquele que está sempre buscando fazer, empreender, desempenhar.
Vamos a Hebreus 11:1-30 – Esta é uma lista de homens e mulheres que ERAM e que TINHAM, pela fé. Homens e mulheres de Deus, o resultado do que fizeram era resultado do que ERAM!
“Ora, a fé é o firme fundamento das coisas que se esperam, e a prova das coisas que se não vêem.
Porque por ela os antigos alcançaram testemunho.
Pela fé entendemos que os mundos pela palavra de Deus foram criados; de maneira que aquilo que se vê não foi feito do que é aparente.
Pela fé Abel ofereceu a Deus maior sacrifício do que Caim, pelo qual alcançou testemunho de que era justo, dando Deus testemunho dos seus dons, e por ela, depois de morto, ainda fala.
Pela fé Enoque foi trasladado para não ver a morte, e não foi achado, porque Deus o trasladara; visto como antes da sua trasladação alcançou testemunho de que agradara a Deus.
Ora, sem fé é impossível agradar-lhe; porque é necessário que aquele que se aproxima de Deus creia que ele existe, e que é galardoador dos que o buscam.
Pela fé Noé, divinamente avisado das coisas que ainda não se viam, temeu e, para salvação da sua família, preparou a arca, pela qual condenou o mundo, e foi feito herdeiro da justiça que é segundo a fé.
Pela fé Abraão, sendo chamado, obedeceu, indo para um lugar que havia de receber por herança; e saiu, sem saber para onde ia.
Pela fé habitou na terra da promessa, como em terra alheia, morando em cabanas com Isaque e Jacó, herdeiros com ele da mesma promessa.
Porque esperava a cidade que tem fundamentos, da qual o artífice e construtor é Deus.
Pela fé também a mesma Sara recebeu a virtude de conceber, e deu à luz já fora da idade; porquanto teve por fiel aquele que lho tinha prometido.
Por isso também de um, e esse já amortecido, descenderam tantos, em multidão, como as estrelas do céu, e como a areia inumerável que está na praia do mar.
Todos estes morreram na fé, sem terem recebido as promessas; mas vendo-as de longe, e crendo-as e abraçando-as, confessaram que eram estrangeiros e peregrinos na terra.
Porque, os que isto dizem, claramente mostram que buscam uma pátria.
E se, na verdade, se lembrassem daquela de onde haviam saído, teriam oportunidade de tornar.
Mas agora desejam uma melhor, isto é, a celestial. Por isso também Deus não se envergonha deles, de se chamar seu Deus, porque já lhes preparou uma cidade.
Pela fé ofereceu Abraão a Isaque, quando foi provado; sim, aquele que recebera as promessas ofereceu o seu unigênito.
Sendo-lhe dito: Em Isaque será chamada a tua descendência, considerou que Deus era poderoso para até dentre os mortos o ressuscitar;
E daí também em figura ele o recobrou.
Pela fé Isaque abençoou Jacó e Esaú, no tocante às coisas futuras.
Pela fé Jacó, próximo da morte, abençoou cada um dos filhos de José, e adorou encostado à ponta do seu bordão.
Pela fé José, próximo da morte, fez menção da saída dos filhos de Israel, e deu ordem acerca de seus ossos.
Pela fé Moisés, já nascido, foi escondido três meses por seus pais, porque viram que era um menino formoso; e não temeram o mandamento do rei.
Pela fé Moisés, sendo já grande, recusou ser chamado filho da filha de Faraó,
Escolhendo antes ser maltratado com o povo de Deus, do que por um pouco de tempo ter o gozo do pecado;
Tendo por maiores riquezas o vitupério de Cristo do que os tesouros do Egito; porque tinha em vista a recompensa.
Pela fé deixou o Egito, não temendo a ira do rei; porque ficou firme, como vendo o invisível.
Pela fé celebrou a páscoa e a aspersão do sangue, para que o destruidor dos primogênitos lhes não tocasse.
Pela fé passaram o Mar Vermelho, como por terra seca; o que intentando os egípcios, se afogaram.
Pela fé caíram os muros de Jericó, sendo rodeados durante sete dias.”
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Depois o texto continua mostrando pessoas que ERAM e NÃO TINHAM.
Verso 38 – homens dos quais o mundo não era digno. É isso que deus pensa deles. Pra nós eram pessoas necessitadas. Pra Deus, eram indignos desse mundo e dignos da salvação.

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Reflexões retiradas do livro “O impostor que vive em mim” - Brennang Manning:
Temos dois ‘eus’: o verdadeiro e o falso. O falso nos convence a ser alguém que todos amem, mas que ninguém conheça. Um culto a esse falso ‘eu’ é pecado. Santidade, portanto, é personalidade, o ‘eu’ verdadeiro, pelo qual cristo morreu na cruz, como o mendigo caído no chão com as chagas abertas, assim como os pecados expostos para que todos vejam, sem dissimulação. O impostor quer enganar, esconder as imperfeições. Vc acha que Cristo morreu por você pelo santo que sempre foi?
O ‘eu’ verdadeiro é o ‘eu’ perdoado, lavado por Jesus Cristo. Nós seremos alguém quando entendermos que Jesus morreu por nós; que foi insuportável ao Pai nos ver numa situação tal, que mandou seu filho para nos resgatar.
O falso ‘eu’ é um nada, e por isso está sempre à procura de coisas que o façam sentir bonito, querido, sedutor, é extremamente carente, precisa ser o melhor profissional, é movido a elogios, tem a auto-estima baixa, pois o fato de Jesus o amar não é suficiente.
Pegue o seu impostor e o apresente a Jesus.
Eu entendo o que Jesus queria dizer com essa parábola: boicote os desejos do seu falso ‘eu’. Falhe nas suas proezas sexuais, no seu glamour, no seu carisma... Experimente a impotência da vida e encontre o seu verdadeiro ‘eu’. Aceite-se como o pecador que vc é. Assim vc experimentará o verdadeiro relacionamento com o seu Deus.
Quando tudo vai mal é que encontramos o consolo do Senhor de fato. É ali que Deus quer te resgatar. A vida espiritual começa com a aceitação do nosso ‘eu’ ferido. Pare de dissimular uma santidade que não combina com você. E diga ao senhor que é assim do jeito que você é.
A gente sabe que a nossa vida de oração é um fracasso. E o máximo que conseguimos apresentar a Deus é uma culpa perfeita. Mas o que redime não é culpa! O que redime é a fé, que significa confiança!  Troque a culpa pela confiança! Qual é a sua religião, a culpa ou Jesus?
Então, meus irmãos, o critério de Deus para avaliar nossa condição espiritual é outro. Pra você se perceber salvo, você primeiro deve se perceber perdido. Isso é santidade, autenticidade, e só encontramos isso na graça de Jesus, onde ele veio amar um pecador.
Não se conforme com a sua condição de pecador, busque sempre a santidade, mas saiba e confie que o seu Deus te ama como o pecador que você é.
Amém.

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